Publicar (na Rede) e Não Perecer

Participei de debate sobre o futuro de revistas acadêmicas em Economia.

Escutei os seguintes argumentos:

  1. Monismo Metodológico: “Para Economia ser reconhecida como Ciência, suas publicações têm de ser medidas/avaliadas sob o mesmo critério de outras Ciências, sejam Exatas, sejam Biológicas”.
  2. Colonialismo Cultural: “Lá fora, nos Estados Unidos, quer goste, quer não, o critério de produtividade acadêmica é quantidade de publicações e citações; portanto, se a produção científica brasileira quiser reconhecimento internacional temos de adotar esse critério”. Ler: Meritocracia.
  3. SSSS (Só Sábios Sabem Selecionar): “Aqui, o critério de qualidade é o artigo ser publicado em revistas com melhores classificações segundo avaliações de alguma Comissão de Sábios, escolhida pela CAPES”.  Ler: Comissão de Sábios.
  4. Fatalismo: “A seleção por dupla de pareceristas ‘cegos’ e ‘anônimos’ não é isenta nem imparcial, pois os editores de revistas os escolhem sabendo quais são os ‘carrascos’ e quais são os ‘corações moles’, mas não há outro critério melhor do que esse”. Ler: Qual-is: qual é?
  5. Atemporal: “Não importa o tempo perdido na divulgação, face à demora habitual em se publicar – em média 3 anos desde o envio do artigo até a publicação, depois de receber dois pareceres positivos -; afinal, o que é abstrato serve para qualquer lugar em qualquer tempo”.
  6. Fahrenheit 451: “Livro não é considerado para pontuação na carreira acadêmica, porque a CAPES não tem como avaliar sua qualidade, afinal, qualquer um (“desqualificado”) pode publicar algum livro por conta própria”.

Contra-argumentei:

  1. O critério de escrever algo, primordialmente, deve ser sentir o prazer da criação, ou seja, o escritor sentir a necessidade e a capacidade de expressar algo escrito para o mundo (ou eventual leitor), nunca se deve escrever apenas por carreirismo.
  2. Depois da felicidade em ter escrito, o maior prazer é ser lido logo por alguém, portanto, nenhum colega anônimo tem o direito de retirar essa oportunidade do eventual leitor avaliar a qualidade do que você escreveu.
  3. Antes, certa seleção era necessária, devido ao alto custo da publicação impressa; a demanda por publicar era muito maior do que a capacidade de tornar tudo acessível ao público, daí, o Qualis estabeleceu, formalmente, o oligopsônio de revistas acadêmicas.
  4. Hoje, já não se justifica mais aceitar a imposição de reserva de mercado e a censura dos pares rivais, camuflada sob suposto “controle de qualidade”; os leitores tem o direito julgar a qualidade do texto escrito: se agradar, eles próprios se encarregarão de divulgá-lo; se não, simplesmente, “não se vira a página”.
  5. A escolha do que (e de quem) ler não ocorre pela classificação da revista ou de livro, mas sim pelo tema e pela reputação do autor.
  6. Sendo assim, blogs individuais ou grupais, sites institucionais, todas essas novas formas de divulgar os escritos devem ser o futuro das publicações acadêmicas, isto é, elas devem ser eletrônicas, gratuitas e livres!

5 thoughts on “Publicar (na Rede) e Não Perecer

  1. Caro Fernando,

    Ontem voltando do Rio, fui surpreendido por pergunta de uma pessoa que indiretamente participa da nossa vida acadêmica local, sobre qual a razão de eu estar na oposição dentro do IE. Perguntei sobre o que se tratava, pois considerei ininteligível a pergunta. Afinal, nem toda divergência é oposição. Em particular, a controvérsia é o que explica o desenvolvimento do conhecimento.

    E, portanto, obrigado pela oportunidade de comentar suas observações. Sendo que as diferenças permitem que o enriquecimento de nossas idéias.

    Tendo participado do debate, gostaria de comentar aspectos tratados por você no seu blog.

    Sempre que tratamos do assunto produção e publicação científica, descobrimos ser ele razoavelmente complexo.

    Em minha fala apontei:
    1. A pesquisa somente existe e tem relevância se seus resultados forem diviuldados;
    2. Em geral, sob o argumento que os pesquisadores se submeteram ao produtivismo, se esconde a ausência de trabalho de pesquisa regular;
    3. Devemos considerar a divulgação através de diversas formas, pois cada uma cumpre uma função determinada. Fiz menção à pouca valorização que se dá à divulgação científica orientada para jovens do ensino fundamental e médio. Apesar de sermos financiados pela sociedade, suprir suas necessidades de conhecimento não é considerado como uma atitude científica;
    4. É preciso considerar as particularidades das áreas de conhecimento, em especial no que diz respeito à maior ou menor aderência ao processo de internacionalização da produção científica.

    Em suma, devemos defender que o trabalho de pesquisa somente tem sentido se divulgado. E que este processo deve primar pela qualidade e pela ética. E, finalmente, que ele se faça sob as mais diversas formas e publicos diversos.

    Como disse o Vinicius sobre o sucesso de Birimbau, eu e Baden ficamos contentes porque, afinal, é para o povo que fazemos nossas músicas. Quanto a nós pesquisadores, é a sociedade que nos financia e é para ela que devemos produzir conhecimento e, também, ficarmos satisfeitos.
    Abraços

    C.Dedecca

    • Dedecca,
      estou de pleno acordo com o que você disse. Saliento apenas que o julgamento da qualidade e da ética deve ser efetuado pelo público em geral e não apenas por colegas anônimos e rivais.
      Grato pelos comentários,
      Abraço

  2. Prof Fernando,

    Encontrei seu blog pesquisando sobre darwinismo bibliográfico. Li vários posts e achei o blog muito interessante.

    Para mim, os livros e as publicações em geral devem ser escritos com paixão e vocação assim como os próprios objetos de estudo devem ser escolhidos baseando-se nestes critérios. Só os livros escritos com alma tem valor.

    Infelizmente, o filtro nas publicações acadêmicas, que servem de trampolim para os pesquisadores, fazem uma seleção elitista entre os pares mantendo cada qual no seu lugar de origem. A sociedade exalta demais os especialistas e estes, muitas vezes, tem se mostrado mais comprometidos com suas próprias carreiras do que com a ciência que estudam.

    Além de movidas pelo entusiasmo, as publicações acadêmicas devem ser escritas em linguagem acessível para atingir um público maior.

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