Lucros: Bancos versus Empresas Não-Financeiras

Álvaro Campos (Valor, 19/05/21) informa: os grandes bancos lidaram com a pandemia de coronavírus melhor do que se esperava quando a crise começou, em março de 2020. Um ano depois dos primeiros impactos nos balanços, o lucro subiu fortemente – impulsionado pela queda nas provisões de crédito, é verdade -, mas a margem financeira começa a dar sinais de melhora.

Daqui para a frente, o maior desafio será recuperar as receitas de prestação de serviços, que já vinham pressionadas pelo aumento da concorrência e agora sentiram também o baque das medidas de isolamento social.

Os dez maiores bancos do país em termos de carteira de crédito tiveram lucro líquido de R$ 38,6 bilhões no primeiro trimestre, alta de 52,8% quando comparado ao mesmo período do ano passado. A carteira de crédito teve expansão de 8,9%, chegando a R$ 4,2 trilhões. O levantamento feito pelo Valor contempla dados de Itaú Unibanco, Banco do Brasil, Caixa, Bradesco, Santander, BNDES, Safra, BV, BTG e Banrisul.

A margem financeira também avançou, surpreendendo analistas, e as despesas cresceram bem abaixo da inflação, mostrando o empenho das instituições em controlar gastos num ambiente hostil.

“Sem dúvida o pior da crise ficou para trás. A inadimplência, mesmo com uma normalização ao longo deste ano, vai ficar muito abaixo do que se esperava”, afirma Thiago Batista, analista de bancos do UBS BB. “A maior preocupação com a pandemia era sobre o impacto na saúde dos bancos, com a inadimplência e até mesmo em níveis de capital, e isso não se tornou realidade”, acrescenta Eduardo Rosman, analista do BTG Pactual.

Principal componente do resultado, a margem financeira teve desempenho até um pouco melhor que o previsto. O indicador reflete sobretudo operações de crédito, mas também de tesouraria, área que cresceu fortemente em bancos como Itaú e Bradesco.

Depois do impacto em 2020 com a queda das taxas de juros e o impacto de linhas emergenciais do governo, que têm spreads mais baixos, a margem financeira começa a se recuperar. Esse movimento reflete tanto o novo ciclo de aumento da Selic, que deve se refletido à medida que novas operações forem contratadas, quanto a retomada de modalidades com retornos maiores, como crédito pessoal, cheque especial, rotativo do cartão e operações para micro e pequenas empresas (PMEs). Com as incertezas associadas à pandemia mais controlados agora, os bancos estão voltando a ampliar a oferta – e a perceber demanda – em linhas de perfil mais arriscado.

Da mesma forma, as instituições preveem melhora na receita com tarifas nos próximos meses, à medida que a economia se recuperar e for possível uma maior abertura dos estabelecimentos, favorecendo o consumo.

Em teleconferência, o presidente da Caixa, Pedro Guimarães, afirmou que algumas linhas de serviços, como seguros, cartões e fundos, devem se recuperar com a retomada da atividade. Receitas com cobranças e arrecadações também devem ser favorecidas pela reabertura, disse o presidente do Bradesco, Octavio de Lazari Jr.

Porém, o executivo reconheceu que as receitas de serviços também sofrem pressão estrutural, e o banco precisa encontrar outras fontes de recursos – como a criação de um marketplace. “É isso que estamos buscando como caminho para substituir tarifas que você deixa de ter porque o cliente faz um Pix em vez de TED ou DOC”, disse Lazari.

Batista, do UBS, afirma que as fintechs são muito mais ameaça para os bancos em tarifas do que em crédito. Ainda assim, ele não prevê um “colapso” nos próximos anos. “Essas receitas devem crescer abaixo da inflação, mas isso pode ser compensado com algumas economias de gastos. Se o Pix ganha tração e as pessoas começam a fazer menos operações com dinheiro, os bancos terão despesas menores com numerário”, diz.

“A pandemia acelerou várias tendências e o open banking vai trazer transformações muito fortes, então o cenário para receita de tarifas ainda é desafiador para os bancos”, diz Rosman.

A agência de rating Moody’s aponta que, em um grupo de dez bancos de médio porte que acompanha, o custo de risco ainda sobe na comparação anual por causa da pandemia, e as margens continuam pressionadas. Ainda assim, a perspectiva é de melhora da rentabilidade neste ano.

Para Rosman, por enquanto os balanços estão bem protegidos, mas a transformação digital é o que vai ditar quem serão os vencedores. “Quem conseguir capturar informações, entender o que o cliente deseja e ter sucesso em mantê-lo dentro de casa vai ter vantagem competitiva”.

Rita Azevedo e Erica Martin (Valor, 19/05/21) informam: a escalada dos preços das commodities no mercado internacional, com a retomada das grandes economias com a melhora da crise sanitária, deu um forte impulso aos resultados das empresas brasileiras de capital aberto no primeiro trimestre.

Uma amostra dos balanços de 322 companhias compilada pelo Valor Data traz avanços expressivos na comparação com o mesmo trimestre de 2020. Ele marcou o início da pandemia. Evoluiu também em relação ao primeiro trimestre de 2019 (ver tabela). Juntas, essas empresas não financeiras de diversos setores lucraram R$ 27,1 bilhões no período, revertendo o prejuízo de R$ 37,4 bilhões no primeiro trimestre do ano passado.

Foi a combinação perfeita de altas históricas de matérias-primas como minério de ferro e aço com a desvalorização do real que continuou a impulsionar exportadoras como Vale (que, junto com Petrobras, não está na amostra para não distorcer o quadro geral) e siderúrgicas.

Gerdau, Usiminas e CSN tiveram resultados recordes. Mas não só. Empresas de outros setores como a fabricante de componentes automotivos Iochpe-Maxion, de produtos de madeira e louças sanitárias Duratex e de motores elétricos WEG também fecharam os três meses em patamares históricos de receita e lucro, apesar da pandemia.

“Não me recordo de um trimestre com resultados tão robustos, tanto no aspecto operacional como no financeiro”, diz William Volpato, coordenador do Valor Data. “Tivemos uma combinação preços de exportação favoráveis e alguma retomada no mercado interno, em especial no começo do ano.”

Crescimentos de mais de 20% na receita e de 86% no lucro operacional destoam nos resultados colhidos nos levantamentos do Valor nas últimas duas décadas. A receita de vendas, por exemplo, costuma crescer por volta 10%, em condições normais de temperatura e pressão.

O primeiro trimestre continuou uma tendência que começou a tomar força a partir do segundo semestre do ano passado. Poderia ser melhor, não fosse a segunda onda da pandemia a partir de março que limitou mais uma vez a retomada.

Como grande parte das restrições de mobilidade começou a ser afrouxada a partir do segundo semestre, lembra Jennie Li, estrategista de ações da XP, a atividade mais acelerada culminou num quarto trimestre com ótimos resultados.page2image3747600

De um total de 85 empresas que fazem parte do universo de cobertura da XP, 77% delas reportaram resultados em linha ou acima do esperado no primeiro trimestre, na comparação com o mesmo intervalo de 2020. Ao todo, 44% dos resultados superaram as expectativas, 33% foram em linha e 23% vieram abaixo.

No quarto trimestre, o número foi ligeiramente melhor, 55% dos resultados superaram as expectativas da XP, 33% ficaram em linha, enquanto 13% ficaram abaixo do esperado.

No setor mineração e siderurgia, todas as empresas que fazem parte da cobertura vieram acima ou em linha com os números projetados no primeiro trimestre, beneficiadas pelos preços mais altos do minério de ferro e do cobre.

E essa onda não deve acabar tão cedo. Em relatório aos clientes, o Credit Suisse reiterou que abril foi outro mês forte para o aço brasileiro, o que reforça a “confiança de que a atividade de construção brasileira continua robusta, alimentada por taxas de juros baixas e aumento da confiança do consumidor”.

Os frigoríficos também continuaram a pleno vapor, como é o caso da Marfrig, empresa beneficiada pelo forte desempenho dos Estados Unidos, que compensou a situação mais frágil no Brasil.

No segmento de alimentos e bebidas, a Ambev “surpreendeu positivamente apesar do momento ainda desafiador para bares e restaurantes”, diz Jennie.

Já no varejo, as empresas do segmento supermercadista, como Assai e GPA, apresentaram fortes resultados apesar de uma base de comparação mais difícil e um trimestre desafiador com restrições de circulação.

“Essas medidas impactaram negativamente as companhias que dependem mais de vendas físicas. Por outro lado, as empresas com canal de comércio eletrônico tiveram um bom desempenho diante do cenário de maiores restrições”, diz Jennie.

Com a reabertura do varejo físico a partir de abril, a estimativa para o este segundo trimestre é de otimismo. “Além disso, a aceleração da vacinação vai ajudar as empresas a terem um desempenho melhor.”

Um problema que continuou a atormentar as empresas no trimestre foi a alta dos preços dos insumos, como já vinha ocorrendo nos dois últimos trimestres. Empresas como a construtora MRV e a fabricante de calçados Vulcabras anteciparam compras para enfrentar a pressão dos custos. A Cury, também do setor de construção, revisou orçamentos. A incorporadora EZTec repassou parte dos aumentos para os preços finais. A M. Dias Branco, que fabrica massas e biscoitos, fez o mesmo e enfrentou a resistência do varejo. O resultado foi uma queda de 25% no volume vendido no trimestre, além da falta de alguns produtos em fevereiro, o que passou a ser normalizado em março, quando o varejo retomou a compra nos novos níveis de preço.

No caso da Natura &Co, os ganhos obtidos com a integração com a Avon tiveram um papel importante na gestão dos custos. “As sinergias estão sendo capturadas e há mais a capturar e têm nos ajudado a enfrentar a pressão de custos, em especial em insumos”, disse o presidente da empresa, Roberto Marques, em teleconferência.

A WEG disse que os efeitos foram, em parte, atenuados por medidas como hedge dos preços das commodities e compras antecipadas de matéria prima. “Podemos ter um descasamento de preço no curto prazo, mas isso tende a ser normalizado no médio e longo prazos”, disse André Salgueiro, gerente de relações com investidores, durante teleconferência.

Um dos setores que deve levar mais tempo para retomar é o de turismo. Para o BTG Pactual, o segmento enfrentará um caminho de recuperação “longo e sinuoso”, com números de viagens retomando aos níveis de 2019 somente em 2022 e início de 2023. “E a recuperação não será homogênea, com os maiores declínios previstos para cruzeiros e viagens corporativas, levando vários anos para se recuperar”, diz o banco.

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