Banquetas não são Bancões

Os bancos de médio porte já sofrem mais que os grandes no atual ciclo de aumento da inadimplência. Com uma carteira menos diversificada, uma postura muitas vezes agressiva para atrair clientes e uma estrutura de funding mais cara, essas instituições tendem a vweuma deterioração mais acentuada na qualidade dos seus ativos em cenários macroeconômicos adversos, como o atual, com inflação e juros elevados e endividamento das famílias perto de níveis recordes.

Dez bancos médios – BV, Daycoval, Banrisul, ABC Brasil, Pan, Inter, Bmg, BNB, Mercantil e Pine – mostram crédito forte, margem crescendo pouco e alguns sinais de piora na qualidade dos ativos. Todas essas instituições são classificadas pelo Banco Central (BC) nas categorias S2 e S3 da escala que define as instituições financeiras conforme o tipo e a complexidade.

No agregado, a carteira de crédito dessas instituições cresceu 14,75% na comparação com março do ano passado, para R$ 301,2 bilhões. O ritmo superou o dos cinco grandes bancos do país (Itaú Unibanco, Bradesco, Santander, Banco do Brasil e Caixa), cujo estoque ampliado de empréstimos e financiamentos que avançou 13,46%, para R$ 4,161 trilhões. A margem financeira dos médios, no entanto, cresceu em um ritmo bem inferior, de 3,1%, somando R$ 8,4 bilhões.

Diversos deles cresceram em linhas com maior risco/retorno, como cartão e crédito pessoal, incluindo BV, Pan e Inter. Outros têm carteiras muito concentradas em produtos mais seguros, como consignado ou crédito para médias e grandes empresas, o que acontece em Mercantil e Pine, respectivamente.

A inadimplência nessa amostra subiu em sete dos dez bancos, ficou estável em um e caiu em dois. O maior recuo, de 0,47 ponto percentual em um ano, foi do Banrisul. A maior alta, de 1,8 ponto, foi do Pan. Entre os grandes bancos, a maior variação foi do Santander, com crescimento de 0,8 ponto. Já as provisões para devedores duvidosos (PDD) tiveram avanço de 49,53% nos médios, contra uma alta de 37,65% nos maiores.

O universo de bancos médios é variado. Espera-se o aumento da inadimplência ser mais acentuado naqueles que têm carteira concentrada na pessoa física, em especial na concessão de cartão de crédito e crédito direto ao consumidor. No caso dos bancos grandes, a composição é mais variada, o que acaba suavizando as variações.

Frente às diferenças de perfis das instituições, o investidor, por ora, está atento principalmente ao comportamento do crédito pessoal sem garantia, especialmente quando consideradas as concessões às classes C, D e E, mais afetadas pelo cenário macroeconômico.

Bancos médios tendem a tomar mais risco que os grandes, dentro do mesmo perfil de cliente, pois não têm o mesmo alcance de distribuição e precisam oferecer um atrativo para o usuário. Em geral, tomam mais risco, o que significa que, quando acertam, ganham mais, mas, quando erram, perdem mais.

Os bancos menores geralmente são focados em dois, três produtos. Quando tudo estava indo bem, com juro baixo, muitos foram para o crédito sem garantia, e foi uma alegria. Agora que o cenário mudou, fica mais difícil.”

Em relatório divulgado nesta semana, investidores brasileiros, preocupados com o cenário macro global, têm optado por investir nos grandes bancos. Historicamente apresentam bons resultados em períodos de inflação e juros altos.

A maioria dos investidores acredita em um ambiente de juros mais altos por mais tempo no Brasil. Isto é prejudicial para as operações da maioria dos players guiados por tecnologia e cujo funding depende do atacado. Isso reduz o interesse nas empresas de pagamento e nos bancos digitais, bem como naqueles negócios com retornos mais baixos, como câmbio e investimentos.

As medidas adotadas no combate à pandemia, como pausas nos pagamentos, o auxílio emergencial e programas de crédito do governo, criaram uma “bolha de adimplência” no sistema financeiro. Agora está murchando. A grande questão é se a inadimplência vai apenas voltar para o patamar pré-pandemia e parar ali ou se subirá além disso e se aproximará dos picos vistos em crises passadas.

A questão é muito mais o ritmo de crescimento daqui para frente. Para ele, o cenário mais provável é de normalização, mas “um pouco acima da média histórica”. Este não é um ano trivial, com um cenário econômico difícil e eleições. Haverá alguma piora na inadimplência, principalmente nas linhas mais arriscadas, e que as instituições adotarão uma postura mais cautelosa nas novas originações.

Ao mesmo tempo, o descompasso entre o crescimento da carteira e o da margem financeira é, segundo analistas, esperado diante do ciclo de alta dos juros. A expectativa é que ao longo dos próximos trimestres essa diferença comece a cair. O custo de captação dos bancos subiu e, como boa parte da carteira é de empréstimos pré-fixados, eles perdem margem. À medida que o portfólio vai girando, as novas linhas já vêm com juros mais compatíveis com os atuais.

Quando percebem que está começando um ciclo de deterioração da qualidade dos ativos, os bancos têm algumas opções. A primeira é restringir a oferta, especialmente em linhas mais arriscadas – reduzindo a emissão de cartões, por exemplo, e elevando as taxas de juros. Algumas instituições podem ter uma postura mais proativa e procurar clientes com dificuldades para renegociar créditos. Um terceiro caminho é vender carteiras em atraso.

Ao comentar os resultados do primeiro trimestre, o Pan afirmou que, desde os últimos meses do ano passado, vem adotando medidas mais restritivas ao antever um ambiente mais difícil. A emissão de cartões caiu de 708 mil no terceiro trimestre de 2021 para 316 mil entre janeiro e março de 2022. A originação de crédito automotivo recuou 13,2% na mesma base, passando de R$ 2,331 bilhões para R$ 2,022 bilhões.

“Antes a gente emitia quase 200 mil cartões por mês, e agora estamos emitindo 100 mil. Reduzimos o ritmo em cerca de 50%. Em veículos estamos originando de 15% a 20% menos por mês. Vamos adequando nossas políticas, nosso gerenciamento de risco, às condições macro”.

A expectativa do banco é que a inadimplência termine o ano perto do patamar atual, de 6,8%. “Temos visto recebimentos melhores em março e abril, não só nas novas safras, mas na carteira como um todo. Desde o fim do ano passado estamos com um crédito mais restrito e uma cobrança mais apertada.”

No Inter, após um crescimento intenso do portfólio de cartão de crédito, também é esperado que o ritmo de concessão caia, com um “maior equilíbrio” com o restante dos produtos.

No BV, a carteira de crédito subiu 5,6% em um ano, para R$ 76,2 bilhões. Os financiamentos automotivos ficaram praticamente estáveis em R$ 41,3 bilhões, mas a originação no trimestre registrou queda de 18,5%, resultado da combinação de uma política mais conservadora de concessões e da queda no mercado de venda de veículos usados, que foi de 24,7%, segundo dados da Fenabrave.

Na virada do terceiro para o quarto trimestre do ano passado, o banco começou a ver uma pressão na inadimplência. Desde então, apertou o crédito e ajustou suas políticas, o que já tem surtido efeito. Isso não quer dizer, no entanto, que o desempenho do segmento automotivo não será mais fonte de preocupação.

“A inadimplência das novas safras já está de novo em um patamar sustentável. O que precisava ser feito foi feito. Mas a questão essencial é quanto tempo vai durar esse choque de inflação e, consequentemente, quão longo vai ser o período de alta nos juros.”

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