PIB per capita e Produtividade

Naercio Menezes Filho é professor titular da Cátedra Ruth Cardoso no Insper,professor associado da FEA-USP e membro da Academia Brasileira de Ciências. Publicou a coluna (Valor, /06/24) abaixo.

O PIB per capita é a principal medida de bem-estar dos brasileiros. Ele depende do percentual de trabalhadores na população e da produtividade destes trabalhadores.

Como tem sido o comportamento destas medidas nos últimos 40 anos? O que explica o baixo crescimento da produtividade do trabalho no Brasil?

Podemos decompor mecanicamente o comportamento do PIB per capita em um componente dado pela produtividade do trabalho, que pode ser medida pelo PIB por trabalhador ajustado pelas horas trabalhadas, e outro componente dado pelo porcentual da trabalhadores na população. Assim, o PIB per capita pode aumentar, mesmo que a produtividade se mantenha constante, desde que haja mais gente trabalhando.

Da mesma forma, se o percentual de trabalhadores se reduzir, como deve ocorrer no futuro, o crescimento do PIB per capita vai depender cada vez mais do crescimento da produtividade.

A figura descreve o comportamento destas séries desde 1981 ate 2023. Um primeiro fato a ser notado é que o percentual de trabalhadores na população, ajustado pelo número de horas trabalhadas, aumentou continuamente entre 1981 e 2008, passando a declinar lentamente deste então.

Isso ocorreu por dois fatores principais. Em primeiro lugar, a participação das mulheres adultas no mercado de trabalho aumentou bastante entre 1981 e 2008, por fatores culturais, diminuição do número de filhos e maior nível educacional, passando de 40% para 63% do total de mulheres, mas se estabilizou deste então.

Além disso, a razão de dependência demográfica, que mede o porcentual de crianças e idosos, que não trabalham, com relação ao número de adultos, diminuiu fortemente neste período, devido à transição demográfica. Este processo está sendo revertido desde o final da década passada, o que significa que a taxa de pessoas que trabalham vai se reduzir ainda mais no futuro, fazendo com que o PIB per capita dependa cada vez mais da produtividade, a não ser que haja um forte aumento da participação das mulheres e dos idosos, que parece improvável.

Vale notar que as horas médias trabalhadas vêm se reduzindo continuamente no período, passando de 46 horas semanais em 1981 para 40 horas em 2023. Parte desde processo decorre da redução de jornada de 48 para 44 horas estabelecida pela Constituição de 1988. Assim, parte do crescimento do número de trabalhadores na economia foi compensado pela diminuição de horas. Enquanto o porcentual de trabalhadores na população aumentou 39%, o porcentual de horas trabalhadas totais aumentou somente 20%.

Com relação ao comportamento do PIB per capita, podemos notar três períodos distintos.

Entre 1981 e 1991, a produtividade declinou acentuadamente, ao passo que o PIB per capita ficou estagnado, porque houve um forte aumento no percentual de trabalhadores, que compensou a queda da produtividade. Entre 1992 e 2003, o PIB per capita aumentou 10%, em grande parte devido ao aumento na produtividade do trabalho trazida pela estabilização da inflação.

Entre 2003 e 2013 o PIB per capita cresceu 32%, o maior crescimento da economia em tempos recentes, provocado por um forte crescimento de produtividade (29%).

No entanto, de 2013 até hoje, o PIB per capita, a produtividade e as horas trabalhadas estão basicamente no mesmo nível, apesar da crise de 2014 e da pandemia.

Assim, nos últimos 40 anos, a produtividade da economia brasileira cresceu somente 20%, ao passo que neste mesmo período o crescimento da produtividade da economia americana foi de 65%.

Como podemos aumentar a produtividade dos nossos trabalhadores?

O primeiro fator que poderia contribuir para aumentar a produtividade dos trabalhadores brasileiros é a melhora na qualidade da educação. Apesar de termos aumentado muito o acesso e a permanência dos jovens na escola, o aprendizado continua muito reduzido.

Basta notar que as notas dos nossos alunos no exame PISA não declinaram entre 2018 e 2022, mesmo depois das escolas terem permanecido fechadas por quase dois anos. Assim, a grande maioria dos alunos brasileiros de 15 anos de idade não têm as habilidades necessárias para ler um texto mais longo e complexo, fazer contas um pouco mais complicadas ou ter um conhecimento básico de ciência.

Uma outra forma de confirmar esse fato é verificarmos o comportamento do indicador de analfabetismo funcional entre os adultos (INAF), que é produzido pelos institutos Ação Educativa e Paulo Montenegro. Esse índice mostra que 30% da população de 15 a 64 anos são analfabetos funcionais e somente 12% são proficientes, capazes de elaborar textos de maior complexidade e interpretar tabelas e gráficos um pouco mais elaborados. O pior é que esta porcentagem se manteve constante nos últimos 20 anos, apesar do grande aumento de escolaridade que houve no período.

Além disto, grande parte das nossas empresas ainda adota práticas gerenciais ultrapassadas, conforme tem sido demonstrado por várias pesquisas internacionais. Estas empresas estão sempre pedindo novos subsídios para o governo, ao invés de investirem em pesquisa e desenvolvimento para aumentar sua produtividade. E só sobrevivem porque a economia brasileira ainda é bastante fechada ao comércio internacional, evitando a competição com empresas externas mais eficientes. Apesar dos vários programas de subsídios à inovação que persistem há décadas, a maior parte das empresas brasileiras é muito pouco inovativa.

Em suma, como a força de trabalho irá crescer menos do que a população no futuro, o crescimento do padrão de vida dos brasileiros irá depender cada vez mais de aumentos de produtividade. No entanto, este crescimento tem sido pífio nas últimas décadas, tanto pela falta de qualificação da mão-de-obra, como pela gestão ultrapassada de grande parte das nossas empresas. Se não mudarmos isto rapidamente, as perspectivas para as novas gerações serão sombrias.

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