Novas Fronteiras Não Convencionais de Exploração e Produção de Petróleo

Simone Goldberg (Valor, 25/09/12) avalia que há uma revolução em curso no mundo do petróleo. Não se trata de uma Primavera Árabe, nem de inflamados protestos antiamericanos em países islâmicos. São, na verdade, as novas fronteiras de exploração e produção, chamadas de não convencionais, e que colocam as Américas no foco das atenções. Nesta lista, estão o tight oil e o shale gas americano – ambos extraídos de rochas, o petróleo das areias betuminosas do Canadá, o pré-sal brasileiro e o óleo extra pesado da Venezuela.

O sucesso dessas explorações pode tornar, a médio prazo, os maiores consumidores de energia – Estados Unidos e China – menos dependentes do petróleo de regiões conflagradas e marcadas pela instabilidade, como o Oriente Médio. Se o petróleo é um recurso finito, essas novas fontes mostram que o fim das reservas está em horizonte além do planejamento das empresas e pessoas. Só de tight oil, os analistas americanos estimam uma produção de três milhões de barris diários em 2020.

“O petróleo ainda estará aí por mais de cem anos, considerando os recursos não convencionais”, diz o professor de Planejamento Energético da Coppe/UFRJ, Alexandre Szklo. Mas nem todos são explorados ainda, pois dependem de inovações tecnológicas que viabilizem a equação custo da empreitada-preço do produto. O caso da Venezuela é um dos que exigem elevados investimentos, mas as areias canadenses e o gás e óleo de rocha dos EUA já tornaram a elevação da produção uma realidade.

Szklo acredita que nos próximos vinte anos, o petróleo crescerá menos – entre 1% a 2% ao ano, puxado pelos países emergentes – do que outras fontes de energia, mas essas não são suficientes para tomar muito do espaço do óleo. Não há substituto para derivados como a gasolina em escala mundial, diz o professor.

Ele aponta os EUA – cuja produção não convencional derrubou os preços do gás e do óleo leve americano WTI em relação ao barril brent, referência do mercado internacional – como o país de maior crescimento na produção de petróleo nos próximos dez anos, caminhando para ser o segundo produtor mundial até 2020.

A Arábia Saudita ficará em primeiro, seguida por EUA e Rússia – que vem disputando a liderança com os sauditas e ficou no topo em 2011, segundo a Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep). Em terceiro viria o Iraque, mas a instabilidade local torna o futuro do país uma incógnita. Na quinta posição surgirá o Canadá – e em sexto, o Brasil, com a perspectiva da Petrobras de atingir uma produção de cerca de cinco milhões de barris/dia, incluindo parte considerável do pré-sal.

Leonardo Maugeri, um dos principais analistas do setor e ex-diretor da petroleira Eni, é autor de um estudo sobre o futuro do petróleo feito na Universidade de Harvard. Nele, diz que a capacidade de produção do mundo vai chegar em 110 milhões de barris por dia em 2020, superando a demanda. Hoje esta capacidade é de 93 milhões e há ociosidade de cerca de cinco milhões de barris diários.

A alta já está sendo puxada pelas fontes não convencionais, mas para isso se manter, o barril precisa de um preço maior que US$ 70 – patamar atualmente superado, já que está girando acima de U$ 100. “Nossa estimativa de preço é a faixa dos US$ 100, levando em conta as projeções de oferta e demanda para o ano que vem”, comenta o analista de petróleo da consultoria Tendências Walter de Vitto.

Já considerando os problemas políticos no Oriente Médio e o embargo ao Irã, as estimativas mostram uma elevação na disponibilidade de óleo. Já a demanda deve ter crescimento lento, em função da desaceleração econômica nos países centrais. Vitto diz que o preço acima dos US$ 100 tem a ver com problemas que afetaram a oferta, como perda de produção no Mar do Norte, os conflitos na Síria e questões políticas que envolveram a separação do Sudão em dois países.

Outro que aposta no preço na faixa dos US$ 100 é o diretor da consultoria gaúcha MaxiQuim, João Luiz Zuñeda. Ele diz que a produção de países tradicionais no ramo vem perdendo força, seja por diminuição de reservas – caso da Arábia Saudita – seja por falta de investimentos, caso do México. “O petróleo de custo baixo para tirar pode acabar em algumas décadas”, comentou.

Além das novas fronteiras, como o pré-sal, exigirem grandes investimentos, as pressões ambientais contra a indústria do petróleo estão crescendo no mundo. A exploração e produção das reservas não convencionais, como as areais betuminosas e o shale gas, têm alto poder poluente e estão sob ataque dos ambientalistas. Zuñeda observa que, se por um lado as grandes petroleiras também apostam em energias renováveis, por outro o custo de exploração de petróleo aumenta para o atendimento da segurança ambiental.

“Os combustíveis de fontes renováveis, que poderiam forçar alguma queda no preço do óleo, não estão aumentando a produção. O que poderia baixar o preço do petróleo seria uma redução do consumo via substituição pelo gás natural“, avaliou. O consultor destaca ainda que os EUA levaram cinquenta anos para viabilizar uma tecnologia economicamente viável para explorar o shale gas (o gás de xisto ou rocha).

Com o aumento da produção previsto, o mundo poderá ver um novo xadrez geopolítico: os americanos exportando gás para a Europa, deixando a Rússia, grande fornecedora dos europeus, tendo de enfrentar um competidor de peso. Zuñeda diz que para mudar o quadro do petróleo nos próximos 50 anos “seria preciso um salto tecnológico que viabilizasse, por exemplo, o carro elétrico de forma massificada”.

De acordo com Tereza Fernandez, diretora da consultoria MB Associados, o divisor de águas dos últimos anos foi justamente o surgimento da tecnologia para tornar a produção do óleo e do gás de rocha nos EUA uma realidade capaz de mexer com a economia. “O gás do Oriente Médio era barato como subproduto do petróleo. Agora os EUA têm como baratear seu suprimento de energia”, comenta. Isso já está permitindo aos americanos uma maior competitividade em vários setores industriais intensivos em energia, como a petroquímica, por exemplo.

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