Desemprego pode ser ainda menor

Indicadores alternativos que ajudam a antecipar o comportamento do mercado de trabalho sugerem que a taxa de desemprego no Brasil pode ser ainda menor do que o esperado para o fim deste ano e até do próximo.

Um estudo do Santander mostra que as demissões a pedido no mercado formal e o cálculo de uma “taxa de demissão involuntária” – isto é, o percentual de pessoas demitidas entre todas aquelas que deixaram seus trabalhos formais – conseguem antecipar o movimento do desemprego brasileiro em cerca de oito meses.

“O assunto está em alta, bancos centrais no Brasil e lá fora estão olhando para o emprego. Queremos saber se, à frente, o mercado de trabalho vai continuar aquecido ou não, mas os dados correntes não dão todo o ‘cheiro’ disso”, explica Felipe Kotinda, economista do Santander e autor do estudo junto com Henrique Danyi. “A nossa conclusão, a partir desses outros indicadores, é que a taxa de desemprego deve ficar mais baixa por mais tempo”.

A taxa de demissão voluntária pode estar associada a dois fatores: 1. a uma maior quantidade de pessoas deixando o mercado de trabalho ou 2. a um maior número de pessoas se realocando dentro desse mercado. “Ambos são fatores indicativos de pressão. Quanto mais alta essa taxa, mais apertado o mercado”.

As demissões a pedido no mercado formal brasileiro estão acelerando. Diferentemente dos Estados Unidos, o Brasil não tem dados sobre demissões voluntárias para o mercado de trabalho total. Os economistas do Santander calcularam as demissões a pedido em relação à população ocupada no mercado formal. Antes da pandemia, essa taxa rodava em torno de 0,5%. Na virada de 2020 para 2021, em meio à crise sanitária, ela foi a 0,4%, mas, desde então, vem crescendo e está em 1,1%.

A “taxa de demissão involuntária”, por sua vez, está historicamente baixa. Ao focar aqueles que foram demitidos involuntariamente, os economistas não incluem na conta pessoas que apenas trocaram de emprego ou que deixaram o mercado de trabalho de vez, porque, por exemplo, se aposentaram.

“Estamos focando aquela parcela de pessoas que devem voltar a buscar emprego no curto prazo. Quanto mais baixa essa medida, menos gente está sendo demitida, mais apertado o mercado de trabalho”, explica Danyi.

Em fevereiro deste ano, pouco menos de 65% de todas as pessoas que deixaram seus postos formais foram demitidas (involuntariamente). Esse valor é bem inferior à média histórica de 2007 a 2023, que roda, em geral, entre 80% e 85%. Ao longo de 2023, essa taxa também ficou abaixo da média histórica, variando entre 65% e 70% ao mês.

A “taxa de demissão involuntária” estava, em fevereiro deste ano, no nível mais baixo da série histórica entre trabalhadores com qualificação baixa (até ensino médio incompleto) e média (até ensino médio completo), de acordo com a classificação do Santander.

Entre trabalhadores mais qualificados (até ensino superior ou além incompleto), o mercado também está apertado, mas não tanto quanto em 2021, quando houve um “boom” do trabalho remoto, que beneficia mais esse grupo, notam Danyi e Kotinda.

Em um recorte setorial, eles observam que a “taxa de demissão involuntária” está perto ou no nível mínimo histórico em todas as atividades mais cíclicas – indústria, construção, varejo e serviços. A exceção é a agricultura, exatamente um setor não cíclico, que depende muito mais, por exemplo, das condições climáticas.

“O aperto no mercado de trabalho está disseminado entre trabalhadores e setores”, concluem Danyi e Kotinda no relatório.

Olhar essas outras métricas é também uma forma de “limpar”o efeito de uma taxa de participação mais baixa, explica Danyi. A taxa de desocupação é uma relação entre as pessoas desempregadas e todas aquelas que estão, de alguma forma, ativas no mercado de trabalho, seja trabalhando de fato, seja procurando uma vaga. Se essa taxa de participação cai, mesmo que o número de pessoas desempregadas continue o mesmo, automaticamente, a taxa de desocupação do país também diminui.

“Parte dos analistas tentou argumentar que o mercado de trabalho não estava tão apertado assim e que o desemprego estaria muito baixo por causa da taxa de participação baixa. Os dados que estamos usando não são impactados diretamente pela taxa de participação e, mesmo assim, eles mostram um mercado de trabalho apertado”, diz Danyi.

O Santander reconhece que suas projeções para taxa de desemprego brasileira de 7,7% no fim de 2024 e de 8,5% em 2025 devem ser revistas para números menores. No boletim Focus, pesquisa do Banco Central com o mercado, as projeções medianas estão em 7,7% e 8%, respectivamente.

Estudo do Banco Pine calcula que para cada 1 ponto percentual de expansão do PIB, a taxa de desemprego recua, em média, 0,35 ponto percentual. É a chamada “Lei de Okun”, que descreve relação inversa entre o hiato (grau de ociosidade) do emprego e o do produto.

Além disso, o exercício sugere que o impacto na taxa de desemprego oriundo do crescimento do PIB atinge um pico após dois trimestres.

Considerando uma projeção de 2,3% para o PIB em 2024 e de 2% em 2025, o Pine estima que a taxa de desemprego média vá recuar de 8,1% em 2023 para 7,5% em 2024 e 6,8% em 2025.

Para calcular a regra de Okun, o Pine utilizada a taxa média de desemprego no ano, “porque o próprio PIB anual é a média da taxa de crescimento dos diversos segmentos da economia nos quatro trimestres do ano, contra os quatro trimestres do anterior”, explica o economista-chefe Cristiano Oliveira. “Além disso, é para fugir da sazonalidade trimestral.”

Para dezembro, a projeção do Pine é de taxas de desemprego ainda mais baixas, de 6,75% em 2024 e de 6,5% em 2025. “O mercado de trabalho deve permanecer aquecido nos próximos anos. E esse é um processo global, que envolve desde questões demográficas até a falta de mão de obra especializada. Ao mesmo tempo em que novas tecnologias substituem o trabalho humano, existe demanda renovada por trabalho em setores da economia tradicional”, diz Oliveira.

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