Gestão de Patrimônio

Gestão de Patrimônio

Alessandra Bellotto e Luciana Seabra (Valor, 28/04/14) informam que os recursos administrados por gestores de patrimônio cresceram 21% em 2013, alcançando R$ 64,4 bilhões, segundo dados reunidos com as 20 maiores instituições do setor, participantes do comitê na Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima). Embora o mercado seja pequeno relativamente ao private bank, ele vem crescendo acima do concorrente, segundo os dados obtidos com exclusividade pelo Valor. O negócio de grandes fortunas administradas pelos bancos no ano passado avançou 9,5%, em ritmo bem menor do que os 21,4% registrados em 2012. Entretanto, eles ainda concentram na gestão de riquezas um total de R$ 577,2 bilhões na gestão de riquezas.

Boa parte do crescimento, segundo Richard Ziliotto, presidente do comitê de gestão de patrimônio na Anbima e sócio da Taler, é dinheiro novo. Conforme explica José Hugo Laloni, integrante do comitê e sócio da LLA Andbank, num ano de baixo crescimento, recursos que poderiam ir para a economia real foram para o mercado financeiro. “Poucas pessoas investiram na economia, boa parte preferiu guardar dinheiro”, afirma.

Ziliotto ressalta que, embora 2013 não tenha sido um ano de grandes eventos de liquidez, como IPOs, empresas de médio porte tiveram oportunidades de negociar participações, especialmente com fundos de private equity. “E o empresário é o perfil de cliente típico do gestor de patrimônio. Ele olhou o custo de oportunidade [o juro] e optou por não investir na empresa, sobrando mais dinheiro para aplicar”, ressalta. Ronaldo Caselli, sócio da gestora de patrimônio Consenso, confirma um movimento expressivo de fusões e aquisições fora dos holofotes. “Continua a haver monetização no mercado, como de empresas não listadas”, conta.

De fato, o patrimônio médio por investidor cresceu bem acima do número de clientes. Os gestores de fortuna encerraram 2013 com uma base 2,9% maior de grupos de investidores, entre indivíduos e famílias, para 4,6 mil, enquanto que os ativos médios por cliente registraram expansão de 17,5% no ano passado, para cerca de R$ 14 milhões.

Já o private bank, segundo dados da Anbima, registrou aumento de 11,3% no número de clientes no ano passado, para 54.314, mas o patrimônio médio por investidor diminuiu 1,8%, para R$ 10,6 milhões.

Laloni lembra que, em períodos ruins, o serviço de consultoria, como o prestado por gestores de patrimônio, ganha mais relevância. Ainda assim, reconhece o gestor, o potencial de crescimento é enorme. Ele estima que esse seja um mercado de R$ 120 bilhões, geridos por cerca de cem instituições do tipo “multifamily offices”. Na própria Anbima, há um total de 30 gestores de patrimônio que seguem o código do segmento, mas, como a divulgação das informações não é obrigatória, nem todos integram as estatísticas.

“É bem menos comum um gestor de patrimônio perder cliente para banco”, acrescenta Ziliotto. Para ele, o potencial desse segmento é grande, mas ainda faltam educação financeira e cultura para que o indivíduo dê valor a uma consultoria ampla, que busque trabalhar com suas necessidades de caixa hoje e no futuro e que mostre, por exemplo, os benefícios de se tornar sócio de uma empresa sólida por meio do investimento em ações em vez de comprar um título público. Quando o juro caiu para patamares mínimos históricos, lembra o sócio da Taler, as vantagens ficaram mais claras e o gestor de patrimônio conseguiu aumentar sua participação de mercado.

Laloni pondera, contudo, que a falta de educação financeira está atrelada ao fato de a cultura de investir ser nova no país. “O dinheiro aqui não tem 30 anos, lá fora tem 400 anos”, ilustra.

As carteiras administradas são o principal veículo de investimento dos endinheirados, com o número de 4.645, ou cerca de 82% do total. Os fundos, contudo, reúnem o maior volume de recursos, com cerca de 64%.

Em termos de estratégia, a renda fixa, que recebe 33,6% do bolo, continua a dividir a preferência dos investidores com os multimercados, com 31,9%. A fatia desses fundos no bolo, entretanto, encolheu em 2013 em relação aos 35,6% do ano anterior. “Esse movimento deve se acelerar, com a troca de expectativa de retorno por retorno garantido”, diz Caselli, da Consenso. Ele conta que os clientes têm preferido não correr risco, dada a incerteza e os juros atraentes na renda fixa. “É confortável não fazer nada agora”, completa.

A busca por títulos isentos, como LCIs, LCAs e debêntures de infraestrutura, continua a ter forte apelo neste ano, diz o sócio da Consenso. As estatísticas da Anbima mostram o crédito privado entre os destaques de classes de ativos. “Em ano sem ofertas de ações, o instrumento de dívida mostrou-se importante, entre eles as debêntures incentivadas e FIDCs [fundos de recebíveis]”, diz Ziliotto. O valor aplicado em títulos privados e FIDCs cresceu 17,9% em 2013.

A renda variável fechou o ano com uma fatia de 23,7%, seguida por fundos estruturados, com 6,8%, e previdência (3,2%). “Essa divisão, em que nenhuma classe de ativos se sobressai, tem a ver com o trabalho do gestor de patrimônio de buscar a melhor alocação possível em busca de performance. Se não tiver retorno, por que o cliente ficaria com o independente e não com o banco?”, afirma Ziliotto.

Além do retorno, o cliente busca no gestor de patrimônio um modelo sem conflito de interesses, considera George Wachsmann, sócio da GPS. O formato de cobrança varia de uma casa para outra. Parte delas é remunerada somente pelo cliente, revertendo para ele qualquer comissão recebida, caso da GPS. Outras casas até recebem os chamados rebates, parte da taxa de administração cobrada pelos gestores, mas o código de autorregulação da Anbima determina que deixem isso claro para o investidor.

Parte dos gestores de patrimônio não tem produtos próprios e seleciona ativos e fundos no mercado para montar o portfólio dos clientes. Outras instituições têm também o serviço de gestão de recursos, como JGP e Claritas, mas a atividade de administração de fortunas é segregada. A regra principal é a transparência.

Para Wachsmann, assim como para Caselli, o segmento de gestor de patrimônio deve crescer menos em 2014 do que no ano passado. “Tem muito dinheiro indo para renda fixa isenta em banco”, diz. A alta dos juros estimula esse movimento. Se o investidor toma a decisão sozinho, esse valor não consta das estatísticas do setor.

Não faria sentido investir em um ativo isento via fundo exclusivo, porque se perderia o benefício tributário. Mas alguns clientes recorrem ao serviço do gestor de patrimônio mesmo para comprar esse tipo de papel, diz André Benchimol, sócio da G5. “Muitas vezes eles não sabem como acessar e selecionar os títulos nem têm tempo para escolher o banco com taxa menor”, afirma, apontando que desde o ano passado a casa tem olhado mais para ativos como letras financeiras e debêntures.

Outro movimento crescente entre donos de grandes fortunas no ano passado foi o investimento em ativos no exterior, com a recuperação de mercados externos e a valorização do dólar. “Quem não tinha nada fora, investiu 5%. Quem tinha 30%, subiu para 40%. E o que tinha 50% foi para 60%”, diz Luiz Felipe Andrade, sócio da gestora de patrimônio Pragma. A casa cuidava dos recursos dos donos da Natura e estendeu os serviços para outras famílias de altíssimo patrimônio em 2006.

Se a aplicação no exterior é feita via uma empresa offshore, ainda que sob consultoria da casa, o valor não entra nas estatísticas locais. Muitos clientes preferiram aplicar via fundo brasileiro por conta das incertezas sobre a legislação, diz Andrade. A Medida Provisória nº 627, publicada pelo governo no ano passado, criou a expectativa de que não se pudesse mais postergar, a partir de 2015, o pagamento do imposto de renda por meio dessas estruturas.

Os dados dos gestores de patrimônio também mostram uma concentração do serviço em São Paulo, com 86,3% dos domicílios de clientes. Há, entretanto, um movimento para outras regiões. A GPS, maior empresa do segmento, está também no Rio, acaba de se estabelecer em Belo Horizonte e abre escritório até o fim do ano em Porto Alegre.

A Consenso, também em São Paulo e no Rio, está em Curitiba há dois anos e tem o desejo de firmar pés em Belo Horizonte. A expansão, entretanto, depende de uma conjuntura de juro mais baixo, diz Caselli. “Fora do Rio e de São Paulo, o conservadorismo cresce e a tendência é investir muito em renda fixa”, afirma, completando que é comum que mesmo os mais afortunados prefiram deixar para correr risco no próprio negócio.

 

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