Mercado de Câmbio: menor Demanda por Hedge Cambial e falta de dólares no Mercado à Vista

Marcelo Osakabe e Lucas Hirata (Valor, 17/07/19) avaliam: o cenário futuro para o Brasil, quando se espera haver menor demanda por hedge cambial ao mesmo tempo quando faltam dólares no mercado à vista, abre uma oportunidade para o Banco Central realizar ajustes em sua política de intervenções no câmbio. Uma possibilidade defendida por profissionais do mercado é a substituição do estoque de swaps cambiais por reservas.

Com a estratégia, o BC faria uma espécie de troca:

  • de um lado, venderia reservas cambiais no mercado à vista, provendo liquidez, e,
  • de outro, reduziria o estoque de um instrumento cujo custo de carregamento aos participantes de mercado tem sido crescente.

O impacto do ponto de vista de risco cambial é zero: o swap já representa, de certa forma, uma venda de dólares e a troca por reservas provê liquidez no mercado à vista, onde hoje há efetiva falta de moeda.

Atualmente, o BC mantém US$ 398,4 bilhões em reservas em moeda estrangeira, consideradas um seguro contra momentos de instabilidade no Brasil e no exterior. Já o estoque de swaps está em cerca de US$ 68,9 bilhões, dos quais US$ 11,5 bilhões vencem em outubro de 2019. A diferença entre ambos pode ser descrita como a posição líquida do BC contra a volatilidade da moeda.

O status de “colchão de segurança” torna as reservas um tema delicado. Costuma gerar grande debate, porque sua acumulação tem um custo. É a diferença entre:

  1. o que o Brasil paga em juros para esterilizar a operação e
  2. o que recebe por investir em ativos seguros, como os títulos americanos.

Economistas divergem sobre vários aspectos, desde qual seria seu nível ideal até qual uso se dar para esses dólares caso se decida reduzir o montante desse seguro.

Na campanha presidencial do ano passado, o candidato Ciro Gomes (PDT) defendeu parte das reservas ser utilizada para abater o principal da dívida pública e na capitalização do BNDES. Proposta semelhante também teria sido feita pelo atual ministro da Economia, Paulo Guedes, quando elaborou o programa de governo do então candidato Jair Bolsonaro. O objetivo seria reduzir o tamanho da dívida pública e da despesa com juros. Questionado sobre o assunto à época, Guedes amenizou: a venda seria feita apenas em um cenário de crise especulativa sobre o câmbio.

A discussão feita pelos profissionais , no entanto, restringe-se apenas a um uso mais eficiente dos instrumentos cambiais. A mudança, no entanto, teria um efeito secundário positivo. Ao desfazer essa posição, o BC reduz custo de carregamento das reservas, o que seria benéfico.

Embora as condições de mercado pareçam favoráveis a essa mudança na estratégia do BC, existe risco de haver ruídos consideráveis caso sua comunicação seja falha. A questão é mais a sociedade entender não ser venda de reservas, reconhecidas como um grande seguro, adquirido no governo Lula, para o Brasil. O que existiria é uma equalização dos instrumentos.

Outro risco é os agentes ficarem com a impressão de o BC com intenção de zerar a posição em swap ou deixar de usar a ferramenta. Nesse cenário, o BC não poderia, por exemplo, se valer de uma eventual recompra destes swaps para suavizar uma queda mais acentuada do dólar no futuro. Tal possibilidade poderia deixar a leitura no mercado de um caminho mais aberto para baixa da moeda americana. Caso siga por esse caminho, o BC deve explicar: não se trata de uma estratégia de redução do volume de reservas. Seria apenas uma troca.

A ideia de aperfeiçoar o uso das ferramentas de política cambial integra a chamada “Agenda BC#” e tem sido um tema constante nos discursos de representantes da autoridade monetária. O dever do BC é reavaliar continuamente os custos e benefícios relativos entre eles e, se for o caso, oferecer alternativas.

Ao mesmo tempo, a nova diretoria tem defendido a manutenção das reservas. “Para você não reservar o seguro, tem que ter muita certeza de que o risco de sinistro caiu muito”, afirmou o presidente do BC, Roberto Campos Neto, em maio de 2019, durante audiência no Congresso Nacional. Na ocasião, Campos ressaltou: as reservas foram um seguro importante para o país sair ileso da crise dos emergentes de 2018. Ele também notou: o custo de carregamento, hoje, é cerca de um quarto do que era antes.

Analistas ouvidos ressaltam, no entanto, o momento quando esse ajuste pode começar a acontecer ainda é incerto. O debate se restringe, por enquanto, aos participantes de mercado, sem interlocução com o BC.

O próprio BC não deixa claro se ou em que momento vai fazer isso. Não se sabe se é uma medida em estudo ou se os técnicos do BC pretendem deixar passar a agenda reformista antes de encaminhar a medida.

Enquanto esse debate não avança, a tendência é o Banco Central continuar enfrentando a escassez de divisas no mercado à vista, rolando e acrescentando, se necessário, posições em leilões de linha – como são conhecidas as operações de venda da moeda com compromisso de recompra.

Em geral, esse instrumento é oferecido em momentos específicos do ano, quando há saída sazonal de recursos, como o fim dos trimestres. Este ano, no entanto, tem ocorrido forte saída de moeda, mesmo com a trajetória de valorização do real dos últimos meses. Somente no mês de junho de 2019, a saída líquida alcançou US$ 8,286 bilhões no Brasil, recorde para o mês em toda a série histórica do BC.

Em parte, a baixa liquidez é um efeito colateral do desenvolvimento do mercado local de capitais, de acordo com os dirigentes do BC. A evolução do segmento teria aberto espaço para substituição do financiamento no mercado internacional por emissões de títulos de dívida no mercado interno.

Efeito não intencional disso, no entanto, tem sido o menor fluxo de moeda estrangeira para o país em 2019 quando comparado ao mesmo período de anos anteriores. Governo populista de direita não é confiável.

Atualmente, o estoque de operações em linha é de US$ 11,65 bilhões e o próximo vencimento, de US$ 3,9 bilhões, ocorre em agosto. É bem provável o BC seguir fazendo essas rolagens para conter certos movimentos na curva. A atuação não é ultra-agressiva e o BC tem atendido bem a demanda do mercado.

Analista de mercado sem visão holística, não percebem o efeito a queda do cupom cambial, isto é, a diferença entre  o juro interno e o juro internacional, considerando a taxa de câmbio esperada. O “capital-motel” estrangeiro já não goza tanto.

Como efeito da queda do juro básico, o custo médio do estoque e das emissões em 12 meses da dívida pública mobiliária interna atingiu a mínima histórica em junho de 2019, resultado do trabalho do Tesouro Nacional em um mês positivo para os mercados em geral e para os emergentes em particular.

A melhora na percepção de risco continuou de forma “intensa” em julho. Com a aprovação em primeiro turno da reforma da Previdência, com queda enorme do risco Brasil, imposto por O Mercado com base em uma hipotética possibilidade de insolvência governamental.

Segundo dados divulgados pelo Tesouro Nacional, o custo médio em 12 meses do estoque da dívida pública mobiliária federal interna chegou a 8,99% ao ano, ante 9,38% em maio. O custo médio das emissões foi a 7,12%, menor do que os 7,13% registrados em maio.

O Brasil, no momento, paga taxas comparáveis ao México, por exemplo. Este tem grau de investimento. A semelhança pode ser observada nos papéis em dólares. Ainda assim, o governo não tem previsão de rever as metas do Plano Anual de Financiamento (PAF).

A Dívida Pública Federal (DPF) subiu 2,24 % em termos nominais de maio para junho, somando R$ 3,978 trilhões. O valor está dentro das metas do PAF, que estabelecem o intervalo de R$ 4,1 trilhões a R$ 4,3 trilhões ao final de 2019. Já a Dívida Pública Mobiliária Federal Interna (DPMFi) registrou uma alta de 2,44%, atingindo R$ 3,826 trilhões. A Dívida Federal Externa somou R$ 151,68 bilhões (US$ 39,58 bilhões), queda de 2,48 %.

No mês de junho de 2019, houve emissão líquida de R$ 67,481 bilhões, resultado de R$ 71,201 bilhões em emissões e resgates de R$ 3,719 bilhões. Os resgates foram concentrados em operações do Tesouro Direto. Com isso, o resgate líquido acumulado no ano caiu de menos R$ 130 bilhões para menos R$ 61 bilhões.

Junho foi um mês favorável para os mercados em geral e para os emergentes em particular. Aqui, houve forte redução das taxas de juros no mercado doméstico. Três fatores contribuíram para esse quadro:

  1. a percepção pelos agentes que haverá mais um corte nos juros este ano, pois a inflação está baixa e a atividade, também;
  2. a perspectiva de aprovação da Reforma da Previdência, e
  3. a perspectiva de juros baixos no mercado internacional, principalmente nos EUA.

Reflexo desse cenário positivo, os títulos prefixados de 10 anos emitidos em junho saíram a uma taxa de 7,47%, 100 pontos-base abaixo do observado em maio. É uma redução significativa para um único mês.

Além disso, mais da metade dos papéis emitidos em junho são prefixados. Com isso, a participação desses papéis no estoque da dívida mobiliária federal interna chegou a 31,53%, ante 31% em maio, avançando sobre os demais. No mês, os títulos atrelados a índices de preços responderam por 26,44% do estoque, os cambiais ficaram em 3,98% e os pós-fixados, em 37,78%, ante 37,88% em maio.

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