Tranformação dos Big Five Bancos 1.0 brasileiros em Bancos Digitais 3.0

O avanço dos bancos digitais se acelerou na pandemia. Levantamento recente feito pela S&P Global Market Intelligence, a partir de dados públicos, mostra que os principais ‘neobanks’ viram o número de clientes subir entre 40% e 50% no primeiro semestre. Seis bancos digitais ouvidos pelo Valor, juntos, somam cerca de 52 milhões de clientes, sendo 30 milhões do Nubank, que adicionou 10 milhões à base somente este ano.

Entre alguns dos principais bancos digitais, é consenso de que ter uma conta gratuita para transações financeiras básicas deixou de ser diferencial. A concorrência está mais acirrada, e o movimento tem sido de adicionar novos produtos e serviços financeiros para rentabilizar a base de usuários. Há, ainda, instituições que apostam no conceito de marketplace.

Um dos ‘neobanks’ mais valiosos do mundo, o Nubank começou há sete anos com um cartão de crédito, lançou conta digital para pessoa física e PJ, empréstimo pessoal e agora também quer disputar uma fatia no mercado de investimentos. Em setembro, anunciou compra da Easynvest, operação que ainda depende de aprovação do Banco Central e do Cade. “Estamos construindo algo para o longo prazo. O objetivo é que o cliente nos ame fanaticamente”, observa Cristina Junqueira, cofundadora do Nubank.

A fintech viu a demanda pelo seu serviço disparar no período de distanciamento social, puxado pelo processo de digitalização e pelas pessoas que optaram por receber o auxílio emergencial na conta digital do Nubank. Para dar conta da demanda, foi preciso reforçar a equipe. Desde março, a empresa contratou mais de 200 funcionários e tem outra 350 posições em aberto, com previsão de fechá-las até o fim do ano.

O Inter começou o ano com cerca de 4 milhões de clientes e recentemente chegou a 7,2 milhões. “Devemos encerrar o ano com 8,5 milhões”, aponta Priscila Salles, Chief Marketing Officer (CMO) do Inter. Uma das principais estratégias é a construção de uma plataforma com produtos financeiros e não financeiros, num modelo de marketplace.

No mês passado, a instituição fez um follow-on de R$ 1,2 bilhão, que permitirá lançar novos produtos e serviços e fazer aquisições estratégicas. “Estamos nos tornando um ‘super app’, e com essa coluna vertebral bancária que nos dá folego para trabalhar com recorrência”, afirma Priscila. Ainda este mês, o Inter prevê colocar no ar uma nova versão da plataforma aberta de investimentos.

A Neon Pagamentos, com 9,6 milhões de contas abertas, também vem ampliando a oferta de produtos. No início do mês, lançou uma conta digital para microempreendedor individual (MEI), por meio da MEI Fácil, fintech comprada no ano passado.

Em julho, a empresa fechou a compra da Magliano, e usará a licença da mais antiga corretora de valores para ingressar de vez no mercado de investimentos. “O objetivo é ajudar as pessoas a ver valor fora dos bancões”, diz Daniel Mazini, Chief Product Officer (CPO) da Neon. Nos próximos meses, a fintech prevê lançar cartão de crédito, maquininha e outros serviços para MEI.

Com pouco mais de um ano de operação, o C6 Bank bateu 3 milhões de clientes. “Nosso posicionamento é ser um banco completo”, destaca Maxnaun Gutierrez, head de produtos e pessoa física do C6 Bank. O ‘neobank’ aposta em diferenciais como programa de fidelidade gratuito, marketplace com mais de 40 mil produtos, plataforma aberta de investimentos e conta internacional. Para o início de 2021, a instituição prevê uma plataforma de investimentos global. Neste ano, também fechou uma parceria com a TIM, que em duas semanas resultou na abertura de 200 mil novas contas.

O BS2 quer ser visto como ‘hub de soluções financeiras’. A instituição começa a atuar com uma plataforma de ‘banking as a service’. “Se conseguimos servir bem o cliente, podemos oferecer nosso core bancário para outras empresas. Já temos conversas”, diz Juliana Pentagna Guimarães, vice-presidente do BS2. Com 600 mil contas abertas, o banco vai começar a ofertar crédito para empresas ainda este ano.

No digio, banco digital que tem Banco do Brasil e Bradesco como acionistas, superou 1,6 milhão de clientes. Com cerca de 900 mil solicitações de cartões por mês, a meta é atrair 5 milhões de clientes e originar R$ 1 bilhão em empréstimo pessoal por ano até 2023. “A gente tenta firmar a bandeira de ‘bantech’. Temos solidez de banco e agilidade de fintech”, diz Ana Paula Bellino, superintendente de marketing, produtos e UX do digio.

A competição está mais acirrada entre as carteiras digitais. Varejistas, marketplaces, operadoras de telefonia, grandes bancos e fintechs têm ampliado a oferta de produtos e serviços financeiros por aplicativo de celular. Ao todo, o Brasil tem cerca de 600 ‘wallets’, incluindo os recém-lançados Bitz, do Bradesco, e OLX Pay, da OLX Brasil. Dois números ajudam a explicar o movimento: 45 milhões de desbancarizados e 230 milhões de smartphones atualmente em uso no país.

O Bradesco resolveu entrar na disputa por uma fatia desse mercado e colocou no ar há duas semanas o Bitz, quase um ano depois que o Itaú Unibanco lançou o iti. Com investimento de R$ 100 milhões no primeiro ano de operação, a plataforma quer abocanhar 25% do segmento em três anos.page2image711296624

Danylo Martins (Valor, 30/09/2020) informa: com serviços financeiros básicos, como transferências, pagamentos e recarga de celular, o Bitz tem como público-alvo a pessoa desbancarizada e o pequeno empreendedor. “A gente quer atingir um público que está carente de serviços financeiros”, explica Curt Zimmermann, CEO do Bitz.

Entre os diferenciais, o executivo cita o ecossistema e a solidez do Bradesco. O aplicativo nasce integrado à Alelo para aceitação de vale-alimentação e vale-refeição, e com uma oferta de crédito da Losango. Nas próximas semanas, o banco vai divulgar a compra de duas fintechs – um dos acordos é com uma carteira digital já em operação. O banco anunciou ontem a compra da fintech DinDin, que atua no segmento de carteira digital desde 2016. Nova aquisição deve ser feita pelo Bradesco ainda este ano, diz Zimmermann.

Maior player do segmento, com 32 milhões de usuários (16 milhões ativos), o PicPay mais do que dobrou a base do ano passado para cá. Um dos principais vetores de crescimento ao longo de 2020 foi o patrocínio do Big Brother Brasil, mas a presença constante em lives de artistas durante a pandemia também ajudou. “Foi a primeira vez que o brasileiro percebeu como é pagar com QR Code”.

No início do ano, a fintech ingressou no mercado de crédito pessoal, com uma operação ainda tímida, em parceria com o Banco Original, seu controlador. Segundo Zarro, os volumes liberados são pequenos, mas a linha de negócio tem ganhado velocidade. A partir de outubro, também será possível fazer depósito e saque no varejo usando o aplicativo.

O Mercado Pago, fintech do Mercado Livre, também vem ampliando o leque de produtos e serviços disponíveis em sua plataforma. Durante a pandemia, a empresa lançou novas funcionalidades, como recarga pré-paga de serviços de TV por assinatura e ampliou a rede de estabelecimentos que aceitam pagamentos com QR Code, conta Rodrigo Furiato, diretor de carteira digital do Mercado Pago.

Na última semana, a fintech recebeu um aporte de R$ 400 milhões do Goldman Sachs para ampliar a capacidade de concessão de crédito para capital de giro a empreendedores. Desde o início da operação de crédito, a fintech liberou mais de R$ 2,4 bilhões para 500 mil negócios. A empresa, que hoje opera como instituição de pagamentos (IP), já deu entrada no Banco Central (BC) para se tornar uma instituição financeira.

O iti, plataforma de pagamentos digitais lançada em outubro de 2019 pelo Itaú Unibanco, se posiciona como uma conta digital completa para o dia a dia e uma rede de 1 milhão de pontos físicos que aceitam o método de pagamento. Em outubro, será lançado o cartão atrelado à conta iti, que permite fazer compras online. O plástico terá informações em braile para pessoas cegas, conta João Filipe Araújo, diretor do iti.

A Movile Pay, do grupo Movile (dono do iFood e de outras marcas), tem como meta no curto prazo ser o principal meio de pagamento do iFood. “Estamos com a ambição de ser a carteira digital para 100 milhões de pessoas. Mas no curto prazo, a meta é ter todos os restaurantes usando”, conta Daniel Bergman, CEO da Movile Pay. Ao todo, 10 mil estabelecimentos já usam a carteira digital. Além das transações bancárias básicas, há oferta de crédito em parceria com as fintechs Mova, Creditas, Credisfera, Bcredi e Finpass. Neste mês, o iFood também lançou um cartão pré-pago para os restaurantes.

Quem também resolveu apostar no mercado de wallets foi a OLX Brasil, que lançou no fim de julho a OLX Pay, com foco nas transações entre vendedores e compradores do marketplace. Pela nova solução, o pagamento pode ser feito com cartão de crédito à vista ou parcelado em até 12 vezes ou com a utilização do saldo existente na carteira digital. Já o vendedor recebe o valor na conta em até 24 horas após a finalização da venda. “Queremos conectar crédito e outros serviços para ajudar nossos usuários”, diz Andries Oudshoorn, CEO da OLX Brasil, hoje com 60 milhões de usuários que acessam todo mês o marketplace.

A Caixa discute com o Banco Central a criação de uma subsidiária para cuidar da sua operação digital, que conta com mais de 100 milhões de clientes, bancarizados no formato digital durante a pandemia. A formalização desse novo braço, ainda sem um nome definitivo, mas sendo chamada de Caixa Banco Digital, é o passo preliminar para uma abertura de capital (IPO).

Os planos do IPO do banco digital foram mencionados pelo ministro da Economia, Paulo Guedes, em conferência sobre as oportunidades de negócios na relação Brasil-Estados Unidos promovida pelo Milken Institute. Como é contumaz por parte dele, é um papo-furado!

“Quanto vale um banco com 64 milhões de clientes?”, questionou, referindo-se ao público do auxílio emergencial. A conta chega a 100 milhões se forem incluídas pessoas que recebem benefício emergencial para o emprego, FGTS e outros programas. A possibilidade de realizar o IPO havia sido levantada em julho pelo presidente da Caixa, Pedro Guimarães, em entrevista ao Valor.

O banco estatal já está aproveitando essa nova clientela para vender produtos da área de seguros. Também está sendo preparada uma oferta de microcrédito para cerca de 10 milhões desses clientes que deixarão de receber o auxílio emergencial em janeiro. E esse financiamento poderá ser acessado por meio do aplicativo Caixa Tem.

O Brasil é a quarto maior mercado digital do mundo, afirmou Guedes. Não pode se dar ao luxo de perder essa oportunidade para ingressar na economia digital.

O governo enviou na segunda-feira ao Congresso uma proposta de marco legal para as startups. O objetivo é criar um ambiente para que elas possam se desenvolver sem embaraços, segundo o divulgador de falsas promessas.

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