Volta da Velha Matriz Neoliberal versus Redução da Extrema Pobreza na América Latina

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Juliano Basile (Valor, 18/10/16) informa que o ritmo de redução da pobreza está mais lento na América Latina desde 2012, segundo o Banco Mundial. A instituição verificou que, entre 2000 e 2014, a quantidade de pessoas vivendo com menos de US$ 2,50 por dia, o que equivale a extrema pobreza, diminuiu de 25,5% para 10,8%. Porém, nos últimos quatro anos, a desaceleração econômica em vários países da região, como o Brasil, resultou em um ritmo “muito mais lento” na taxa de redução da pobreza.

“Ao mesmo tempo, a desigualdade teve uma ligeira redução, embora ainda se mantenha em um patamar elevado”, verificou o Banco Mundial em relatório divulgado no dia 17/10/16, em Washington.

No documento, a instituição apontou que houve avanços na educação, como o aumento de matrículas escolares, e na expansão da prestação de serviços de eletricidade para as pessoas mais necessitadas. Por outro lado, a atual desaceleração econômica interrompeu a expansão da classe média.

“Para a região continuar com a grande transformação social que ela empreendeu desde a virada do século, precisamos garantir que a cada criança ou jovem seja oferecida uma oportunidade justa para poder cumprir o seu verdadeiro potencial”, disse Jorge Familiar, vice-presidente do Banco Mundial para a América Latina e Caribe. “No contexto da desaceleração econômica, é ainda mais importante melhorar as oportunidades para as crianças desfavorecidas, como o acesso a uma boa educação”, completou.

O relatório aponta que o Brasil e a Argentina apresentam as pontuações mais altas de Índice de Oportunidade Humana (IOH) em educação. Esse indicador mede o nível de equidade de acesso a serviços básicos nos países, particularmente à educação para jovens e crianças. Ele verifica taxas de matrícula, nível de acesso a água encanada, saneamento, luz elétrica e internet.

No Brasil, a cobertura de matrículas escolares atingiu 98,4% e a conclusão do ensino fundamental está em 71,7%. A cobertura de eletricidade está em 99,5%, a de água atingiu 93% e a de saneamento chegou a 92,6%. A cobertura de internet está em 40,2% e a telefonia celular em 94,1%. Os dados usados são de 2014, ano da reeleição democrática da Presidenta Dilma, golpeada posteriormente pelos neoliberais.

Os maiores desafios na América Latina estão nos serviços de saneamento, em que o IOH está em 65,4%. Na telefonia celular, o acesso subiu de 13%, em 2000, para mais de 90%, em 2014. Já a cobertura de internet ainda está inferior a 50% na América Latina.

O monitoramento dessas condições faz parte da proposição de meta pelo Banco Mundial de erradicar a pobreza extrema até 2030.

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Sergio Lamucci (Valor, 18/10/16) avalia que a “era dourada” dos mercados emergentes pode estar no fim. Para a consultoria Capital Economics, esse grupo de países crescerá daqui para frente a um ritmo bem mais modesto do que o registrado a partir dos anos 2000. Tendências demográficas e perspectivas pouco animadoras para produtividade apontam para um avanço do Produto Interno Bruto (PIB) não superior a 4% nos próximos anos, bem abaixo da média de 6% desde 2000, avalia a consultoria.

“Com os emergentes respondendo agora por mais da metade do PIB global, a diferença que esse crescimento mais lento fará para a economia mundial nas próximas décadas será profunda”, afirma a Capital, em relatório. A consultoria tem uma visão mais pessimista para o futuro desse grupo de países do que a do Fundo Monetário Internacional. Para o FMI, o crescimento dos emergentes sairá da casa dos atuais 4% e subirá para cerca de 5% nos próximos cinco anos.

“Se considerarmos que essa taxa de 5% será então sustentada, o PIB dos emergentes dobrará entre hoje e 2030”, diz a Capital. “Mas, se esse salto não se materializar e prevalecer a nossa estimativa de crescimento em cerca de 4%, o PIB emergente será consideravelmente menor. Em 2030, a diferença entre a nossa projeção e a do FMI é de US$ 20 trilhões [em termos de paridade do poder de compra].”

Na visão da Capital, há poucas chances de uma melhora sustentada dos emergentes. “O crescimento aumentou recentemente, mas, com limitada capacidade ociosa, a aceleração não vai durar”, acredita a consultoria, ressalvando que alguns países terão um desempenho acima da média de 4% esperada para os próximos anos. A Índia e a China, por exemplo, devem crescer a um ritmo superior a essa média.

Um dos pontos que dificultam a repetição do crescimento mais forte é que a aceleração se deveu muito mais a fatores que ocorrem uma vez só, e não de uma mudança duradoura no desempenho desses países, diz a Capital. “A adoção de políticas mais amigáveis ao mercado nos anos 1990 e nos anos 2000, assim como a disseminação da tecnologia, ajudou na integração com outros emergentes e com o mundo desenvolvido”. [bullshit neoliberal…] 🙂

“A China foi o exemplo mais visível da abertura de uma economia, e o seu crescimento rápido e intensivo em investimento auxiliou outros países em desenvolvimento ao aumentar os preços de commodities“, diz a consultoria. Outras economias, como as da América Latina e as do antigo bloco soviético, seguiram uma trajetória parecida.

“O resultado foi um salto da expansão da produtividade no mundo emergentes.”  [FNC: expansão do PIB > expansão da PEA ocupada] O problema é que isso perdeu força, e ganhos tão expressivos de eficiência não devem se repetir. “As economias só podem se abrir uma vez, e não há mais nenhum grande mercado emergente sobrando para se integrar ao mundo.”

No relatório, os economistas Mark Williams e Neil Shearing dizem que a Índia é o único país que poderia “plausivelmente” ter um impacto tão grande quanto teve a China. A questão é que a Índia já se integrou, segundo eles. “O país é membro da Organização Mundial do Comércio (OMC) desde o começo. As suas tarifas já são muito baixas.” Além disso, o país já exporta tanto quanto a China em relação ao tamanho de sua economia.

A África, por sua vez, é populosa e em grande parte pobre, o que indica um potencial para um crescimento rápido. O continente, porém, é dividido em 50 países. “Individualmente, os sucessos deverão ser da escala da Coreia do Sul, mais do que da China.”

Para completar, as tendências demográficas estão se tornando menos favoráveis. “A população em idade para trabalhar ainda está crescendo na maior parte dos países, mas a taxa de expansão está desacelerando em quase todos os países.” Na África subsaariana, a expansão da população em idade ativa (PIA) deve ser de mais de 3% ao ano nos próximos 15 anos. No Oriente Médio, o número será próximo de 2%. Já na América Latina e na Ásia emergente, excluindo a China, ficará na casa de 1%. Enquanto isso, na China e na Europa emergentes a PIA cairá.

Em resumo, o crescimento populacional e o impulso que ele pode conferir à expansão da economia estão em desaceleração quase em todos os lugares. Se a produtividade se mantiver inalterada, o crescimento mais lento da força de trabalho vai reduzir o crescimento potencial desses países em 0,7 ponto percentual na média dos próximos 15 anos em comparação com os últimos 15.

Nesse cenário, uma expansão forte nos emergentes deverá voltar a ser a exceção, e não a regra. “De fato, a automação crescente e o uso de robôs na indústria pode tornar mais difícil o tipo de expansão intensiva em trabalho e liderada pela manufatura, como seguido pelos emergentes mais bem sucedidos no passado.”

No relatório Panorama Econômico Mundial divulgado no começo de outubro de 2016, o FMI nota que a transição da China para uma economia mais baseada no consumo e nos serviços continua a influenciar outros emergentes, “notadamente produtores de commodities e países expostos ao setor manufatureiro chinês”.

“Os efeitos do reequilíbrio [?!] da economia do gigante asiático sobre o comércio e o crescimento globais também têm sido significativos”, diz o FMI, ressaltando que não é algo surpreendente – em 2015, o PIB chinês superou o tamanho conjunto das outras 12 maiores economias emergentes.

Ao tratar do Brasil, o relatório aponta o impacto da queda dos preços de commodities como um dos fatores que contribuíram para tornar a demanda mais fraca. A Capital também destaca o impacto negativo das baixas taxas de investimento, que afetam o Brasil e outros países como Turquia, África do Sul e Rússia. Se essas taxas não subirem, a expansão da produtividade nessas economias não deverá decolar.

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Assis Moreira (Valor, 07/10/16) informa que o fluxo global de investimento estrangeiro direto (IED) deve cair de 10% a 15% neste ano e ficar entre US$ 1,6 trilhão e US$ 1,8 trilhão, com contração tanto nos países desenvolvidos como nos em desenvolvimento, segundo novas projeções da Agência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Unctad).

Esse declínio é atribuído a:

  1. a fragilidade da economia mundial,
  2. a persistente debilidade da demanda,
  3. o crescimento medíocre dos países exportadores de matérias-primas e
  4. a queda significativa dos lucros das empresas multinacionais.

Para Mukhisa Kituyu, secretário-geral da Unctad, a queda no fluxo de IED é ainda mais inquietante “porque a economia global necessita urgentemente de investimentos para se recuperar“.

As incertezas na economia internacional terão mais impacto no comércio e nas cadeias globais de valor, onde o processo de produção, que é fragmentado entre países, aumenta as trocas externas, sobretudo de bens intermediários. Para a Unctad, o caminho para a retomada de investimentos parece cheio de obstáculos.

O “moderado pessimismo” da agência da ONU se junta a indicadores negativos divulgados nos últimos dias por outras organizações internacionais.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) alertou que um amplo fenômeno de baixa inflação, alimentada pelo colapso dos preços de commodities e pela fraca demanda, aponta para o risco de deflação, sobretudo nos países ricos.

A Organização Mundial do Comércio (OMC) revisou para baixo a projeção do volume de exportações e importações para apenas 1,7% este ano. Esse é:

  1. o pior resultado das trocas globais desde a crise financeira de 2008 e
  2. uma enorme redução comparado à estimativa de 2,8% feita em abril de 2016.

A Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) constata que a economia global caiu em uma “armadilha do baixo crescimento“, com queda simultânea de comércio, investimento e produtividade.

A análise da Unctad aponta diferenças para o fluxo de IED nas regiões. O volume para a África deve voltar a crescer, como resultado de medidas de liberalização e planos de privatização. Os fluxos para países em desenvolvimento da Ásia poderão cair 15%, retornando aos níveis de 2014. Na América e Latina, a projeção também é de queda. A recuperação do IED nas economias desenvolvidas registrada em 2015 dificilmente será mantida neste ano.

Entre os megagrupos na economia global, a contração no fluxo de IED poderá variar de 5% a 10% no G-20, que reúne as maiores economias desenvolvidas e emergentes, baixando para algo próximo de US$ 830/US$ 880 bilhões. Nos países da Cooperação Econômica Ásia-Pacífico (Apec) a queda é estimada entre 15% e 20%, para US$ 760/US$ 810 bilhões. O fluxo para os Brics (Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul) pode, porém, voltar a crescer em 10% na média, para US$ 270/US$ 290 bilhões.

A Unctad prevê uma leve recuperação no fluxo global de IED em 2017, que poderia passar de US$ 1,8 trilhão em 2018.

O volume de investimento estrangeiro direto (IED) para a América Latina deverá ser 10% menor do que em 2015, caindo para algo entre US$ 140-US$ 160 bilhões, mas o principal culpado não será o Brasil, a maior economia da região, mas a persistente recessão na região, segundo a Unctad.

Porém, a agência da ONU vê a possibilidade de melhora no fluxo de IED ao longo do ano, graças a fatores como a desvalorização cambial, que pode motivar a aquisição de ativos na região.

A Unctad destaca que dados preliminares para o primeiro trimestre indicam que as fusões e aquisições transfronteiras cresceram 80% graças a vendas líquidas de ativos no Brasil, Chile e Colômbia, embora essa comparação seja distorcida pelo acentuado declínio ocorrido nessas operações em igual período de 2015.

A situação econômica do Brasil continua frágil, mas o país atrai investimentos diretos por causa também de sua moeda desvalorizada, enquanto pode haver quedas em alguns países na América Central e do Sul”, diz um técnico da Unctad. Segundo o Banco Central, de janeiro a agosto o ingresso de investimentos estrangeiros destinados ao setor produtivo somou US$ 41,1 bilhões.

Na América Latina como um todo, os investimentos “greenfield“, que começam do zero, continuarão fracos, com o número de projetos caindo 19% e seu valor diminuindo 18% no primeiro trimestre.

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